quinta-feira, 13 de março de 2008

Entrevista geoglifos

Miriam Bueno é geógrafa formada pela Universidade Federal do Acre (Ufac) e Doutora em Ensino e História das Ciências da Terra, pela Unicamp - Campina - SP. É professora há mais de 28 anos, trabalha no Laboratório de Geoprocessamento da Ufac, e atualmente é Coordenadora Regional do Projeto de Pesquisa sobre Geoglifos do Acre. Projeto este, que conta com o apoio do Governo do Estado do Acre e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); e que tem como Coordenadora Geral, a arqueóloga Denise Shaan da Ufpa (Universidade Federal do Pará).


Jornal Capixaba - Primeiramente gostaríamos que a senhora definisse geoglifos.
Miriam Bueno - Etimologicamente, geo significa terra e glifos significa marcas, ou seja, marcas na terra. Mas, por enquanto, o que se sabe é que são sítios arqueológicos. Quem fez, para que fez, como e quando não se sabe.

Jornal Capixaba - Assim, o objetivo da pesquisa que estão coordenando seria a identificação de respostas a essas interrogações.
Miriam Bueno - Certamente. Os primeiros geoglifos do Acre foram descobertos pelo arqueólogo Ondemar Dias em 1977. Depois disso, novas descobertas foram feitas por Alceu Ranzi (Paleontólogo). Através do projeto que, além de doutores, engloba também vários acadêmicos de geografia e de engenharia florestal da Ufac, inclusive uma acadêmica de geografia de Capixaba, a aluna Alderina Moura, com certeza pretendemos alcançar informações que enriqueçam os nossos conhecimentos sobre geoglifos do Acre. Estamos tendo todo o apoio para isso.

Jornal Capixaba - Quando os estudos começaram e o que já foi feito até agora?
Miriam Bueno - O projeto foi aprovado em janeiro de 2008 e conta com a parceria do Governo do Estado e CNPq. Até hoje já foi feito o que chamamos de prospecção, fizemos o mapeamento das áreas, escavações para sondagens. E com isso, já identificamos cerâmicas, alguns artefatos arqueológicos, ossos, etc.

Jornal Capixaba - Por que a preservação dos geoglifos é importante para o Acre?
Miriam Bueno - Primeiro pelo ponto de vista histórico, pois nós podemos descobrir a verdadeira história dos povos da floresta; segundo pelo ponto de vista dos pesquisadores em arqueologia, envolvendo novos alunos e pessoas já formadas; pela gestão e ordenamento territorial (carro-chefe do Governo para orientar a definição e implementação de suas políticas); pela possibilidade do uso desses sítios para o turismo, pois como Capixaba está na linha do desenvolvimento, de repente o município poderá estar explorando isso. Só o fato da recente descoberta de um geoglifo a 1000 metros da Prefeitura de Capixaba, nas terras do senhor Bimbarra, (em homenagem ao proprietário da terra, o geoglifo foi batizado de Bimbarra), já abre caminho para uma nova atividade turística para a região.

Jornal Capixaba - E como se dá essa preservação? Que consciência a população deve ter em relação a esses sítios arqueológicos?
Miriam Bueno - É importante ressaltar que os geoglifos do Acre estão em fase de estudos científicos e que ainda não podemos criar mecanismos de utilização dos mesmos, pois se não preservarmos antes de fazermos o estudo, corremos o risco de perder informações valiosas para a ciência. Mas, depois dos resultados, podemos analisar as possibilidades de uso, preservando claro, a história. Isso porque estamos resgatando uma história que não existe mais ninguém para contar, pois se trata de informações existentes há mais de 1000 anos. Quanto à população, principalmente, a rural, pedimos sempre que ela seja parceira dos nossos trabalhos, pois há grandes possibilidades da existência de Geoglifos dentro da mata, fato não possível de identificação por meio de sobrevôo. Desse modo, é muito importante que a comunidade dê a sua contribuição para a ciência nos ajudando com a identificação das áreas que possuem geoglifos.

Jornal Capixaba - É difícil o processo de identificação pela comunidade? E como deve proceder, caso encontre essas marcas na terra?
Miriam Bueno - Há geoglifos em forma de círculos, linhas, quadrados, etc. A facilidade maior de identificá-los, é através de sobrevôo, e como se trata de mata fechada, não tem como utilizarmos esse recurso. A descoberta via terrestre não é um método fácil, mas a importância da divulgação de como se apresentam os sinais é determinante para a preservação. Numa área já desmatada, por exemplo, muitas vezes, sem conhecimento, as pessoas se deparam com uma vala e aproveitam para fazer dali uma reserva de água para os bovinos. É lamentável, mas muitos geoglifos já sofreram algum tipo de impacto por falta de conhecimento a respeito. Então, sabendo da importância desses sítios para a ciência, as pessoas ficarão mais conscientes em contribuir com a pesquisa. Agora caso alguém encontre geogli-fos em sua propriedade, procurar tornar pública a descoberta, entrando em contato com o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), Prefeituras, Secretaria de Meio Ambiente do seu Município, ou com o Departamento de Geografia da Ufac.

Jornal Capixaba - Até hoje, quantos geoglifos foram descobertos no Acre?
Miriam Bueno - Até agora, ao todo, foram descobertos 120 geoglifos. Em Capixaba já identificamos 31. Temos o geoglifo Hortigranjeira, o Gavião, o Ciço cara-de-pau, vários na Fazenda Crixá, Santa Gertudes, e a mais recente descoberta, o geoglifo Bimbarra.

Jornal Capixaba - A Prefeitura de Capixaba tem dado importância às descobertas?
Miriam Bueno - Posso afirmar que a Prefeitura entrou em contato com a gente para discutir o assunto. No momento, estamos aguardando da mesma a definição de uma data para a realização de uma reunião. Tudo indica que eles estão se mobilizando.

Jornal Capixaba - Para finalizar, temos conhecimento de que a Álcool Verde contratou uma equipe multidisciplinar para realizar estudos acerca dos geoglifos nas áreas de ocupação da Usina. Isso com a intenção de reformular o EIA (Estudo de Impacto Ambiental) e em seguida, elaborar o RIMA (Relatório de Impacto Ambiental). A senhora faz parte dessa equipe?
Miriam Bueno - Sim. E é importante destacar o empenho da Álcool Verde nesse sentido. A responsabilidade que o Grupo Farias tem com a preservação dos sítios arqueológicos é muito grande. Por conta disso, o estudo hoje está bem adiantado.

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